TALENTOS

TALENTOS
 
Os percalços que a vida tem
Já não nos causam mais espanto
Tanta solidão e desventura
A gente ver por todo o canto
Há tantos males e misérias,
Cada vivente com o seu pranto.
 
Mas nossa vida é assim mesmo,
Tão contundente, tão real,
Na qual poucos têm muitos bens,
Muitos, com pouco, passam mal.
Como fugir do reservado
A cada um, tão desigual?
 

Arte de Amar

Arte de Amar
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus — ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
 
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
 
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
 
(Manuel Bandeira )

O AMOR

VLADIMIR Maiakóvski
 
 O AMOR
 
Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zoo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o enxame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então,
de todo amor não terminado

OBAOBA DO SENEGAL

O baobá no Senegal
 
É a grande árvore maternal
de corpulência de matrona,
de dar sombra embora incapaz
(pois o ano todo vai sem folhas)
pela bacia de matriarca,
pelas portinarianas coxas,
pela umidade que sugere
sua carnadura (aliás seca e oca),
vem dela um convite de abraço,
vem dela a efusão calorosa
que vem das criadoras de raça
e das senzalas sem história. 
( J. CABRAL MELO NETO)

TEU OLHAR

O TEU OLHAR
Quando fito o teu olhar,
Duma tristeza fatal,
Dum tao íntimo sonhar,
Penso logo no luar
Bendito de Portugal!
 
O mesmo tom de tristeza,
O mesmo vago sonhar,
Que me traz a alma presa
Ás festas da Natureza
E á doce luz desse olhar!
 
Se algum dia, por meu mal,
A doce luz me faltar
 
Desse teu olhar ideal,
não se esqueça Portugal

O jovem Rupestre

O menino deixou a chinela a mamadeira Deixou o bico o trem Deixou a frauda a moto Deixou o carro e a sorte para o mês que vem Deixou de lado tudo que trasporta e ficou em cadeira de vai e vêm Deixou a sorte para o acaso Deixou suas mãos pintadas na rocha rupestre Deixou cinco dedos na História para contar que não tinha pressa Só não deixou ninguém esperando e foi embora

A menina e o Livro

Sentada sem preocupação Perto de minha casinha papelão Peguei um livro da minha tia Era velho e pesado passei a ler Percebera que não havia espaço sem reino E não havia reino sem espaço Que tinhas barquinhos água e sal Tinham palavras em lutas que impulsionavam a Nau Tinha homens em lutas Tinham reinos em lutas Tantas labutas epopeias homéricas Deixei o livro na sala e fui brincar com minhas borboletas Batizei uma delas de lusíadas o nome do livro da tia O livro era velho e pesado as borboletas não a são Pois não havia espaço sem reino e reino sem espaço E lusíada minha borboleta preenchia

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