Geral

JOVEN CAPTIVA

Respeita a foice a espiga verde ainda;
    Sem medo da vindima, o estio inteiro,
    Bebe o pampano as lagrimas da aurora:
    E eu verde como a espiga, tenra e linda
    Como o pampano, hei-de morrer? não quero:
            Quero, mas não por ora!

    Talvez que a outrem, morte, grata fosses.
    Espero! Embora em lagrimas me lave,
    Varre-me o norte a mim a face? inclino-a.
    Se ha dias tristes, ai! ha-os tão dôces...
    Sem amargo, que mel, por mais suave
            Que mar, em paz continua?

*FALSTAFF MODERNO*

In vino veritas

Quando eu morrer, ninguem lerá no craneo
      Se eu fui mouro ou judeu,
Se presava o _cognac_ ou o _Madeira_,
      Que soffrer foi o meu!

Ninguem dirá se era trigueiro ou louro,
      Se eu fui Pope ou Camões,
E os sabios não dirão, coçando a calva,
      A côr dos meus calções.

Não saberão dizer se foi a pipa
      O hotel em que vivi,
E se fazia sol ou aguaceiros
      No dia em que nasci.

O Tonel do Rancor

O Rancor pe o tonel das Danaidas alvíssimas;
A Vingança, febril, grandes olhos absortos,
procura em vão encher-lhes as trevas profundíssimas,
Constante, a despejar pranto e sangue de mortos.

O Diabo faz-lhe abrir uns furos misteriosos
Por onde se estravasa o líquido em tropel;
Mil anos de labor, de esforços fatigosos,
Tudo seria vão para encher o tonel.

O Rancor é qual ébrido em sórdida taverna,
Que quanto mais bebeu inda mais sede tem,
Vendo-a multiplicar como a hidra de Lerna.

IMPROVISO

 

Porque languida essa frente
Descai, quando a tarde espira?
Porque nesse olhar dormente
Tua alma ingenua suspira?

Porque? ai! porque? responde;
Que se amor do ceo procura,
Eil-o; em meu peito se esconde;
Vive, é teu, tens a ventura!

Verás como então brilhante,
Seduz, toma vida, inspira,
Esse teu bello semblante,
Que apenas hoje se admira!

Ilha da Madeira--Novembro de 1850.

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