Desilusão

Átropos, Minha Belladonna

I

Belladonna, minha dona bela!
Que em ti trazes o doce veneno
De uma trágica morte amarela.
(Salvação do meu viver pequeno...)

Tu, bela, que nas sombras moras
E quase sempre o sol evitas,
Deixa-me comer tuas amoras
Embriagar-me com as pepitas!

Anda ter comigo, ó Belladonna
Que o destino uniu-nos sem igual!
Não t'armes comigo em primadonna,
Quero a libertação deste mal!

Dilata-me as pupilas,
Que te eu quero ver melhor!
Amansa-me estes espasmos,
Deste persistir com dor...

Ambiguidades

Vivo a minha parca vida
Em sobressaltos e solavancos
Tenho os sentimentos mancos
E a consciência entorpecida

Pois aquando me alegro
Não tarda o desengano...
Sinto o cerrar do pano
Da minha felicidade.

Mas porque? Se ainda
Nem sinto o peso da idade...
Haverá uma razão
Para tal ambiguidade?

Ébrios

O Mundo gira e gira, e volta a girar
Dá mais uma volta, não pode parar
Nós, os ébrios, aqui nos quedamos
Por sermos tão loucos, às vezes erramos

Se o que nos move, ao chão nos agarra
Prefiro o imóvel àquilo que amarra
Prefiro a desgraça ao som da toada
Ao menos sou livre e não tenho nada

Fixos aqui, o mundo observamos
Entorpecidos no acumular dos anos.
Inertes, apáticos, algures perdidos
Não nos mexemos... Contemplamos!

Aqui Jaz Uma Vida

E quando aqueles dia há
em que nos encontramos perdidos,
sem nada que nos entretenha
ou nos ocupe o pensamento?
Nessas alturas apraz-me fumar
orgulhosamente um ocioso cigarro,
com a desculpa ilusória de que mata
a pasmaceira em que ando submergido.
Saco, delicadamente, o palito nicotínico
enquanto exclamo aos meus botões:
"Mais um prego para o caixão!"
Com a outra mão estalo a tampa do zippo,
Mola aguda que, simultaneamente, me estala o pensar
com a consciência da finitude irrevogável.

Fado / Fardo / Foda-se

Calminha, coração...
Vai com calma,
não te exaltes!
Que é que se passa?
Pensas que é por ti
que o mundo vai parar?

O mundo nunca pára,
seja por quem for,
muito menos por ti,
um ignóbil rastejante
que reptila as suas mágoas
à espera da pena alheia...

És um triste!
Faz-te um homem,
ainda vais a tempo.
Mas achas mesmo
que há alguém que se vai
dignar a esperar por ti?

Afogamento

De tempos a tempos, quando não sempre,
Invade-me o corpo um impiedoso amor
E transborda pelos meus poros,
Materializa-se em grossas lágrimas,
Cristalinas da mais pura mágoa,
Em suspiros e tremores de alucinado,
Sintomas de não ser, em retorno, amado.

Palhaços

Qual é a face humana que realmente se mostra?

Aquela que se escancara em um fingido sorriso?

Ou aquela outra que se enruga em profundo ciso?

Qual merece crédito quando na face se prostra?

 

Sim, porque se escondemos a nossa dor nas risadas

Apenas para que de nossa dor ninguém mais saiba

Também escondemos  a alegria para que não caiba

O escárnio e a indiferença de canalhas disfarçadas.

 

Ri coração, escarnece de ti mesmo, triste palhaço

E tira, inda que seja à força, de sua fria mônada

POR NÃO ESPERAR MAIS NADA

Veio a manhã antecipar a hora
Da certeza que, em ti, já pressentia
Pelo que a tua boca não dizia
Mas confirmavas em cada demora.

Crescia a solidão, quando, lá fora
A noite amiga, ainda se estendia
Em disputa de tempo com o dia
Desfasando-lhe o despontar da aurora.

Por fim, sentiu-se a noite tão vencida
E tão fora do tempo que era seu
Que se desfez, cedendo à madrugada
Que chegou, sem saber que era a medida
De um tempo novo, em que serei só eu
A esperá-la... por não esperar mais nada.

MAIS UMA PÁGINA

 

Mais uma página volto, neste livro

Que dia-a-dia escrevo, em sofrimento

São páginas pintadas, de cores tristes

Que povoam em permanência, o pensamento.

 

Pintadas com cores, que não são belas

Não têm brilho, textura, nem beleza

Escuras, que nos cegam, e nos tolhem

Que doem, nos magoam…dão tristeza.

 

Neste livro que escrevo, hora-a-hora

Com palavras que são, o meu sentir

De novo outra uma página, escreverei

Onde lá não está gravado, o meu sorrir.

 

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