Desilusão

Sonhos Náufragos

Dizem que são os sonhos
Quem nos comanda a vida.
Pois então eu estou morto,
Porque em mim o sonho morreu!

Não há motivação ou ambição,
Apenas tristezas e cansaços.
E até a esperança vai acabando
A cada minha nova golfada de ar!

O meu íntimo grita socorro
Mas os ouvidos alheios tapam-se...
Nunca há quem o queira escutar,
Não há ninguém para se preocupar!

Sutura

No silêncio escuro da noite
Ilumina-me esta breve consciência:
Os outros desistiram de mim,
Eu há muito desisti dos outros!
A solidão em que agora me percebo
É o reflexo do cego isolamento
Que sempre procurei dos outros...
Misantropo, eis o que me tornei!

Átropos, Minha Belladonna

I

Belladonna, minha dona bela!
Que em ti trazes o doce veneno
De uma trágica morte amarela.
(Salvação do meu viver pequeno...)

Tu, bela, que nas sombras moras
E quase sempre o sol evitas,
Deixa-me comer tuas amoras
Embriagar-me com as pepitas!

Anda ter comigo, ó Belladonna
Que o destino uniu-nos sem igual!
Não t'armes comigo em primadonna,
Quero a libertação deste mal!

Dilata-me as pupilas,
Que te eu quero ver melhor!
Amansa-me estes espasmos,
Deste persistir com dor...

Ambiguidades

Vivo a minha parca vida
Em sobressaltos e solavancos
Tenho os sentimentos mancos
E a consciência entorpecida

Pois aquando me alegro
Não tarda o desengano...
Sinto o cerrar do pano
Da minha felicidade.

Mas porque? Se ainda
Nem sinto o peso da idade...
Haverá uma razão
Para tal ambiguidade?

Ébrios

O Mundo gira e gira, e volta a girar
Dá mais uma volta, não pode parar
Nós, os ébrios, aqui nos quedamos
Por sermos tão loucos, às vezes erramos

Se o que nos move, ao chão nos agarra
Prefiro o imóvel àquilo que amarra
Prefiro a desgraça ao som da toada
Ao menos sou livre e não tenho nada

Fixos aqui, o mundo observamos
Entorpecidos no acumular dos anos.
Inertes, apáticos, algures perdidos
Não nos mexemos... Contemplamos!

Aqui Jaz Uma Vida

E quando aqueles dia há
em que nos encontramos perdidos,
sem nada que nos entretenha
ou nos ocupe o pensamento?
Nessas alturas apraz-me fumar
orgulhosamente um ocioso cigarro,
com a desculpa ilusória de que mata
a pasmaceira em que ando submergido.
Saco, delicadamente, o palito nicotínico
enquanto exclamo aos meus botões:
"Mais um prego para o caixão!"
Com a outra mão estalo a tampa do zippo,
Mola aguda que, simultaneamente, me estala o pensar
com a consciência da finitude irrevogável.

Fado / Fardo / Foda-se

Calminha, coração...
Vai com calma,
não te exaltes!
Que é que se passa?
Pensas que é por ti
que o mundo vai parar?

O mundo nunca pára,
seja por quem for,
muito menos por ti,
um ignóbil rastejante
que reptila as suas mágoas
à espera da pena alheia...

És um triste!
Faz-te um homem,
ainda vais a tempo.
Mas achas mesmo
que há alguém que se vai
dignar a esperar por ti?

Pages