Prosa Poética

Ela existe

Naquele largo ensolarado e frio, o crepitar da vida ouve-se com uma sonoridade diferente: a vida mecânica sobrepôs-se à biodiversidade. Os pássaros foram substituídos pelo rosnar dos aviões que voam baixinho o suficiente para sentir a vibração do cinzeiro e da mesa metálica desta esplanada que enfrenta em tom de irónica provocação aqueles que evitam o contacto com o tabaco.
 

Fait accompli

Consumou-se a noite num carrasco silêncio redundante e supérfluo
Tão melífluo quanto aquele breu perdido no cardápio do tempo dulcífluo
Tão pérfido quanto um lamento permutado por angustiantes uivos impudicos
 
Consumado o tempo alimentou as entranhas desta solidão indulgente

Naufrágio ao luar

Naufragou este luar emborrachado por um licoroso eco semântico
Foi o prelúdio das palavras aconchegadas a um negróide desejo apoteótico
Foi o derradeiro espasmo deixado no velório de cada sussurro tão osmótico
 
Nas vastas planícies da noite escorrega a maresia tão bêbeda, tão impotente

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