HISTORIA SIMPLES

Havia um rapaz são, robusto, bom, valente,
De espadua larga e rija; um ceifador gentil.
Cavava todo o dia, andou sempre contente
E a feria dava á mãe sem falta d'um ceitil.

Elle amava a campina e os ceus largos, serenos.
Aos domingos a mãe deixava-lhe uns dez reis.
Deitava-se ao luar, dormindo sobre os fênos,
Na fragrancia do trêvo, ao pé dos cães fieis.

*Purinha*

O Espirito, a Nuvem, a Sombra, a Chymera,
Que (aonde ainda não sei) neste mundo me espera
Aquella que, um dia, mais leve que a bruma,
Toda cheia de véus, como uma Espuma,
O Sr. Padre me dará p'ra mim
E a seus pés me dirá, toda corada: _Sim_!
Ha-de ser alta como a _Torre de David_,
Magrinha como um choupo onde se enlaça a vide
E seu cabello em cachos, cachos d'uvas,
E negro como a capa das viuvas...
(Á maneira o trará das virgens de Belem
Que a Nossa Senhora ficava tão bem!)
E será uma espada a sua mão,

LYRA V.

A caso são estes
Os sitios formosos,
Aonde passava
Os annos gostosos?
São estes os prados,
Aonde brincava,
Em quanto pastava
O manso rebanho,
Que Alceo me deixou?
    São estes os sitios?
    São estes; mas eu
    O mesmo não sou.
    Marilia, tu chamas?
    Espera que eu vou.

Correspondências

A natureza é um templo augusto, singular,
Que a gente ouve exprimir em língua misteriosa;
Um bosque simbolista onde a árvore frondosa
Vê passar os mortais, e segue-os com o olhar.

Como distintos sons que ao longe vão perder-se,
Formando um só voz, de uma rara unidade,
Tem vasta como a noite a claridade,
Sons, perfumes e cor logram corresponder-se

Há perfumes subtis de carnes virginais,
Doces como o oboé, verdes como o alecrim,
E outros, de corrupção, ricos e triunfais

_No dia dos Annos da Illustrissima, e Excellentissima Senhora D. Maria de Noronha, hoje Condeça de Valladares_.

Senhora, os pobres vestidos
Do vosso humilde Compadre,
Não o deixão ir aos Annos
Da sua Illustre Comadre;

O conhecido Colete
De bordadas guarnições,
Encartado ha longo tempo
Em Colete das Funções;

Sobre os seus cançados annos,
De humido Inverno Assaltado,
Cheio de invenciveis manchas
Me foi hoje apresentado;

Em vão bemfeitor miôlo
Lhe esfrega o quarto offendido;
A minha choroza Mana
Dá o cazo por perdido;

*Desditosa cecem!*

      Pobre flôr, que se estiola
      Na vertente da montanha,
      Ninguem aqui te consola
      Fria sombra te acompanha.

      Commoção que te desola!
      Uma peçonhenta aranha
      Sobre a nitida corolla
      A sua rede emmaranha!

      Quem te lançou no degredo
      D'este acerbo pavimento
      Para te olvidar tão cêdo?

      --A meus paes fugi mesquinha
      Fugi nas azas do vento
      Triste sorte foi a minha!...

Canção da Torre Mais Alta

Juventude presa
A tudo oprimida
Por delicadeza
Eu perdi a vida.
Ah! Que o tempo venha
Em que a alma se empenha.

Eu me disse: cessa,
Que ninguém te veja:
E sem a promessa
De algum bem que seja.
A ti só aspiro
Augusto retiro.

Tamanha paciência
Não me hei de esquecer.
Temor e dolência,
Aos céus fiz erguer.
E esta sede estranha
A ofuscar-me a entranha.

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