MULER
Autor: José António Fe... on Friday, 26 February 2021MULHER
Quando tudo é pouco
E o que se é não chega
Pergunta-se o Deus onde falhou,
Pobre diabo
Ignorante de si mesmo,
E tu,
Nasces de ti
Sem te teres por amparo
E choras de amor.
Quando tudo é pouco
E o que se é não chega
És montanha onde dormem os ecos
De cegas súplicas perdidas
Sedentas de agradecer em sorriso.
Fazes das mãos melodia,
És o soar que cuida,
Pele alcova de milagres.
Quando tudo é pouco
E o que se é não chega
NIRVANA
Autor: José António Fe... on Thursday, 25 February 2021ESCURIDÃO
Autor: José António Fe... on Thursday, 25 February 2021ESCURIDÃO
Chegou o dia,
Foi a maré viva que o anunciou
Trazia na espuma acordes de alucinação
Fragmentos do canto da unidade primordial
Qual coro trágico
Senhor das nuances do destino.
A manhã engalanou-se
O cheiro verde da campina
Bordou em bilro a luz mãe do derramar da terra,
No ar bailou difusa a exaltação da vida
Sorriram os frutos nas máscaras de vermelho.
Juntos segredavam em entusiasmo descarado:
— Chegou o dia.
HEDONISMO
Autor: José António Fe... on Thursday, 25 February 2021HEDONISMO
Só por maldade
Se pode negar o vermelho à maça
Qual voz rouca suavemente arrastada
Que pede à mão cuidado na colheita.
Assim fez Eva,
O seu corpo entornou-se em luz
Que delicadamente beijou os olhos de Adão
Que sem saberem já suplicavam beleza.
Deus, já velho, virou a cara
Procurou reminiscências do arrepio
Provocado pelo frenesim das células
Mas só encontrou despojos
De guerras, pragas e castigos.
Olhos de vidro não choram
MIDAS
Autor: José António Fe... on Thursday, 25 February 2021MIDAS
No tempo
Em que as coisas eram o que eram
A naturalidade acontecia naturalmente
A noite era o adormecer do dia
E o primeiro raio de sol
O campeão das corridas à velocidade da luz.
As coisas eram o que eram
Sem razão nem porquê
A simplicidade,
No sentido simples da simplicidade,
Era a essência do choro sobressaltado do rio
Era a paciência da planície
Na intermitência da sua vontade.
Quando as coisas eram o que eram
Não havia sujidade,
ADRO
Autor: José António Fe... on Thursday, 25 February 2021ADRO
Ainda é noite nos meus olhos,
O sol teima em arrancar-me à morte
A que me entrego em esperança fingida.
A indiferença das vontades prisioneiras do conteúdo dos sacos de plástico
Que o corpo carrega contente
Como extensões com que a natureza o dotou
Castiga as tentativas de me arrancar ao degredo.
Acabou a missa,
As almas benzidas fundiram-se com o bafo a álcool,
Eu assisto ao arraial consciente da minha transparência.
Não pequei menos na renúncia ao copo de vinho
soneto
Autor: Sílvio Alves on Thursday, 25 February 2021Deixa em meu leito teu corpo cansado
Das horas aprazíveis que vivemos
Na ilha de lençóis, que desfizemos
Por amor, com raiz de aço forjado.
És lua, és luar, se às escondidas
Despes o manto que te cobre o corpo,
És o sol, se descobres o teu rosto,
És mulher e possuis toque de Midas.
Se me tocas, por certo não sou oiro.
Posso ser tudo aquilo que quiseres,
Escolhi-te entre todas as mulheres,
Aos meus olhos és mais do que tesoiro.
Tocas-me e como abelha beija a flor,
Transformas desafecto em puro amor.