DESEJO
Autor: Soares de Passos on Monday, 12 November 2012
Por cima dos paúes, das montanhas agrestes,
Dos rudes alcantis, das nuvens e do mar,
Muito acima do sol, muito acima do ar,
Para além do confim dos páramos celestes,
Paira os espírito meu com toda a agilidade,
Como um bom nadador, que na água sente goso,
As penas a agitar, gazil, voluptuoso,
Através das regiões da etérea imensidade.
Eleva o vôo teu longe das montureiras,
Vai-te purificar no éter superior,
E bebe, como um puro e sagrado licor,
A alvinitente luz das límpidas clareiras!
Senhora, o Forte da Estrella,
Chorando o bem que perdeo,
Das suas justas saudades
Por portador me escolheo;
Quiz que eu viesse contallas
Ao som desta rouca Lyra,
De longos annos affeita
A acompanhar quem suspira;
Não fallo nos ternos Pais;
Nelles a alta Jerarquia
Tempéra saudozo pranto
Com o pranto da alegria;
Ao nome dos seus Passados
Planos caminhos achárão,
Unindo ao sangue de Heróes
O sangue de Heróes que herdárão;
Juraste a minha perdição, ingrata,
A quem adóro como adóro a vida
Casta flôr, flôr de neve estremecida,
Que sorris, quando o teu olhar me mata.
Gravei no peito aquella rubra data
Em que te vi, amor! qual na avenida
Se entalha na fiel casca endurcida
O nome da huri, que nos maltracta
E, apesar de seres tão bella e mansa,
Folgas que a desventura me persiga
Dilacerado de cruel esp'rança.
A diferença entre a literatura e o jornalismo é que o jornalismo é ilegível e a literatura não é lida.
Dos meus antepassados gauleses tenho os olhos azuis pálidos, uma firmeza limitada e a falta de habilidade na luta.
Quem fez ao sapo o leito carmesim
De rosas desfolhadas à noitinha?
E quem vestiu de monja a andorinha,
E perfumou as sombras do jardim?
Quem cinzelou estrelas no jasmim?
Quem deu esses cabelos de rainha
Ao girassol? Quem fez o mar? E a minha
Alma a sangrar? Quem me criou a mim?
Quem fez os homens e deu vida aos lobos?
Santa Teresa em místicos arroubos?
Os monstros? E os profetas? E o luar?
Ó trevas, que enlutais a Natureza,
Longos ciprestes desta selva anosa,
Mochos de voz sinistra e lamentosa,
Que dissolveis dos fados a incerteza;
Manes, surgidos da morada acesa
Onde de horror sem fim Plutão se goza,
Não aterreis esta alma dolorosa,
Que é mais triste que voz minha tristeza.
Perdi o galardão da fé mais pura,
Esperanças frustrei do amor mais terno,
A posse de celeste formosura.
Leda serenidade deleitosa,
Que representa em terra um paraíso;
Entre rubis e perlas, doce riso,
Debaixo de ouro e neve, cor-de-rosa;
Presença moderada e graciosa,
Onde ensinando estão despejo e siso
Que se pode por arte e por aviso,
Como por natureza, ser formosa;
Fala de que ou já vida, ou morte pende,
Rara e suave, enfim, Senhora, vossa,
Repouso na alegria comedido:
Estas as armas são com que me rende
E me cativa Amor; mas não que possa
Despojar-me da glória de rendido.
Em que estado, meu bem, por ti me vejo,
Em que estado infeliz, penoso e duro!
Delido o coração de um fogo impuro,
Meus pesados grilhões adoro e beijo.
Quando te logro mais, mais te desejo;
Quando te encontro mais, mais te procuro;
Quando mo juras mais, menos seguro
Julgo esse doce amor, que adorna o pejo.
Assim passo, assim vivo, assim meus fados
Me desarreigam d'alma a paz e o riso,
Sendo só meu sustento os meus cuidados;