Soneto

Adeus

 

Faço o meu silêncio de sua ausência

E me calo perante sua distância

Pois, dos sonhos retirei a lembrança

Do amor que quase me pôs à falência.

 

Do sentimento tão lindo, a crença

Da eternidade e a má-aventurança

Do crédito na falsa aparência

Que, da solidez, perdeu a segurança.

 

Do infinito, resta só a saudade,

(Suas palavras ofuscaram o brilho

Da fantasia que era a nossa verdade).

 

Só os cacos de um coração andarilho

Doído, triste, errante e sem auxílio

Soneto da Modernidade

 

O mundo gira, a vida passa e a gente anda

Gira, anda, passa porque nada é eterno

Se hoje uma flor caiu porque é inverno

Amanhã, na primavera, volta a uma ciranda.

 

Em cada passo dado, uma canção que se canta

Em cada canção nasce um novo ser interno

Que, se exposto com todo o grande amor paterno

Se recicla e retorna de forma mais branda

 

Em cada tempo e cada era uma história

Feia ou bonita, só expressa a verdade

Que se repete sempre nessa trajetória

 

BAILARINA

Sobre ela vai repoisar a gentil lampejo,
Quando seus pés delgados desenhar a dança.
Sua cadência elástica encanta a criança,
Que na caixinha a expia com igual desejo.

Um sonido afável seus impulsos conduz,
Sua face purpúrea expressões vai moldando...
Rastejando no chão ou no ar quase voando,
Como vertem fulgor seus dous olhos azuis.

Seus passos onde a harmonia lança rebentos,
Deslumbram mesmo o espelho que lhe assiste mudo,
E deslizam tranqüilos no dorso dos ventos!

Soneto Esquizóide

Desperta a primaveril nostalgia,
Após longos e chorosos dias
De densa, tão cinzenta invernia
De fazer finar em noites frias.

Brilha-me o sol nos olhos, agora.
Momentaneamente esqueço as vis horas
Em que o meu ser sempre se demora
E tarda a sair, sem vislumbrar melhoras.

Oh bipolaridade nefasta que me corrompes!
Que a mim me trancas em negros pensamentos
E só por vezes levas à rua beber das fontes!

Livro

A vida me pôs nas mãos um lindo e delicado livro. Lhe faço

Um carinho. Deslizo minhas mãos maciamente por seu dorso

Malicioso, preparo-me para fazer uma viagem, um lindo corso

Por cada página, cada palavra sua, por cada linha, cada traço.

 

Lúdica e ansiosamente, confesso, abro-o. E o que mais espero

É que cada uma e todas as palavras de suas alvíssimas folhas

Tragam contidas dentro de si – quais coloridas lindas bolhas

As mensagens de paz e de amor que tanto desejo, tanto quero.

 

Impossível

Nasceu assim. De repente. Nem sei quando

Se foi quando você falou, ou apenas sorriu

E repentinamente toda minha segurança ruiu

E eu me vi como estou agora, só lhe amando.

 

E agora, todo dia me vejo assim, impaciente

Prá lhe ver, sentir seu cheiro, ouvir sua voz

Prá guardar você na memória e depois, a sós

Medicar essa paixão, me sentir menos doente.

 

Mas (existe sempre um mas) depois eu penso:

Para viver essa paixão, ignoro todo bom senso

Ou continuo amargando essa solidão terrível?

 

Ponto G

Sabe o que eu queria mesmo? Seu corpo mapeado

Para que todos os caminhos que eu nele seguisse

Levassem você a sentir tudo, tudo que eu sentisse

Por muito mais de um milhão de vezes multiplicado.

 

Sabe o que eu queria mesmo? Encontrar o ponto

Exato para o toque do prazer máximo, da loucura

Mas são tantos os pontos seus que, nesta procura

Você me põe primeiro exangue, perdido e tonto.

 

Por isso, lhe falo baixinho obscenidades ao ouvido

Ou mordisco seus lábios, ou beijo seu peito túrgido

Esqueletos de Sonhos

Sonhos? Eu sonho. Tu sonhas. Mas, de que serão feitos

Os sonhos? Será de alguma vontade inda não realizada?

De alguma ânsia que se queda frágil, não materializada

Fazendo de corações e almas pares tristes, insatisfeitos?

 

Ah, os sonhos. Elocubrações que a mente humana gera

E que, pari passu, seguem lado a lado com a nossa vida

E quando não realizados, são como uma dolorosa ferida

Que torna a nossa vida tão inócua, tão insalubre,tão mera.

 

Apesar de não existirem, de cinza, ficam por aí os sonhos

Mandinga

Oxossì, Obalúaye, Òsúmàré, Ogum e Iansã

Me respondam, por favor, urgentemente:

De onde vem isso que já me faz dormente

Como quem está refém de uma febre tersã?

 

Dei agora para ouvir atabaques e tambores

Mesmo quando eu e minha’lma estamos sós

E nesta nativa sinfonia há o grave de uma voz

Cantando a força de mil esquecidos amores.

 

E agora deuses, o que faço: abro minhas velas

E viajo nas tintas da paixão destas aquarelas

Águas

Lembro que, maliciosamente, brinquei com teus pelos

E percorri com a ponta dos meus dedos tão maliciosos

Cada curva de cada pequeno seio teu – dons preciosos

Túrgidas e belas testemunhas da fome dos teus apelos.

 

Comi tua nudez. Amei cada um dos teus belos detalhes

E me adonei gostosamente de todas as tuas lindas vias.

Te vi chovendo. Borrasca de paixão, tu toda escorrias,

E qual rara peça esculpida, me expunhas teus entalhes.

 

E na tua boca sequiosa – desejo – eu me fiz teu alimento

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