Soneto

Obscura

Se dizias que me amavas

Então dizes por que deixou

No meu coração as maiores cavas

De um amar que nunca me amou!

 

Nunca brinques com o coração d'um apaixonado

Pois este é frágil, preso e inocente

E por mais que da paixão carregue o fardo

Não merece sofrer desse calor latente...

 

E agora, te vejo obscura

Como um cadáver jogado à morte

Como a alegria que a vida me roubou

 

Percebo que o amor não procura

O ser com a melhor sorte

Para adoentá-lo com a praga do amor!

 

Seria um Sonho?

Tudo o que vejo, ouço e sinto

Seria de fato realidade?

Ou seria só a perversidade

D'um audacioso labirinto?

 

Seria tudo isso um fantasioso sonho?

Onde a angústia, meu medo medonho

Estraçalha o palpitar despalpitado

De meu pobre coração angustiado?

         

Então que depressa eu acorde

Para que não mais me recorde

Deste sonho repleto de medo

 

Recuso o sono que o tempo me trouxe

Pois se um sonho a minha vida fosse

Não seria sonho, e sim pesadelo.

 

Ao Mar (SONETO ANTIGO)

    Ó meu amigo Mar, meu companheiro
    De infancia! dos meus tempos de collegio,
    Quando p'ra vir nadar como um poveiro
    Eu gazeava á lição do mestre-regio!

    Recordas-te de mim, do Anto trigueiro?
    (O contrario seria um sacrilegio)
    Lembras-te ainda d'esse marinheiro
    De boina e de cachimbo? Ó mar protege-o!

    Que tua mão oceanica me ajude,
    Leva-me sempre pelo bom caminho,
    Não me faltes nas horas de afflicção.

"Delicado”

          

 

 

Desperta-se o silêncio da noite quebrada

Com tempestades, heróicas, heranças, saudades…

Ai, que de mim, cai folha abandonada,

Sob a fúnebre pedra, fria, da calçada…

 

Tu, que pertences aos beijos da madrugada;

Na magia adocicada, que o acordar entende…

A sua presença

Assim como a exultação dos pássaros felizes,
Em cada alvorecer radiante e matinal,
Onde a aurora projeta-se na esfera astral,
Seu sorriso aflora, sarando as cicatrizes.

O deslumbre da sua presença imponente,
Atinge um espectro que transcende a lógica,
E em cada evolução sua, simples e metódica,
Deixa marcas de alegria em cada mente.

Se é Doce

Se é doce no recente, ameno Estio
Ver toucar-se a manhã de etéreas flores,
E, lambendo as areias e os verdores,
Mole e queixoso deslizar-se o rio;

Se é doce no inocente desafio
Ouvirem-se os voláteis amadores,
Seus versos modulando e seus ardores
Dentre os aromas de pomar sombrio;

Se é doce mares, céus ver anilados
Pela quadra gentil, de Amor querida,
Que esperta os corações, floreia os prados,

Erros meus, má Fortuna, Amor ardente

Erros meus, má Fortuna, Amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a Fortuna sobejaram,
Que para mim bastava Amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que já as frequências suas me ensinaram
A desejos deixar de ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa a que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

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